Portugal: “fábrica” de qualidade?

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A relação que os portugueses têm com o ‘made in’ Portugal é ainda muito difícil. De acordo com alguns autores, a grande referência de antigamente era a França, mais tarde a cultura Anglo-Saxónica tomou as rédeas da moda e, ultimamente, as influências dominantes estendem-se, além das anteriores, à Espanha e ao Brasil. As razões são variadas e algumas decorrem das vicissitudes da nossa história. No entanto, segundo algumas opiniões, chegou a hora de libertar o “fabricado em Portugal” de discriminações, muitas delas relacionadas somente com a origem.


Como forma de combater esta filosofia dominante, a Associação Empresarial de Portugal (AEP) lançou uma campanha que vai decorrer até ao final de 2009, sob a designação “Portugal, a minha primeira escolha”. Este projecto quer incentivar os portugueses a comprar o que por cá se produz, promovendo um país moderno e inovador, apostando desta forma na valorização da oferta nacional.


De acordo com José António Barros, presidente do conselho de administração da AEP, a par da internacionalização e do incremento das exportações, as empresas portuguesas têm na promoção interna dos seus produtos e serviços uma excelente oportunidade de sustentabilidade económica face à crise económica global. Fruto dos investimentos em inovação, investigação e qualidade ocorridos nos últimos anos, consumir português assume-se essencialmente como uma questão de atitude. Segundo a organização, as opções de consumo fundadas unicamente na proveniência de um produto ou serviço estrangeiro não têm justificação. Num mercado maduro como o nosso, submetido a crescentes mecanismos de regulação e de supervisão, os consumidores portugueses têm ao seu alcance condições de escolha e de escrutínio da qualidade e de garantia de satisfação idênticas às da generalidade dos países da União Europeia.


Esta campanha segue-se à iniciativa “Compro o que é nosso”, lançada em Outubro de 2006 e que no final do ano passado contava com 350 empresas aderentes, detentoras de 1500 marcas. Também a Hedla, sedeada em Coimbra, se juntou a esta acção. “A nossa adesão ao projecto visou a sensibilização de todos os portugueses para o consumo de produto nacional, apoiando assim o crescimento da indústria no nosso país”, referiu Maria Adelaide Mesquita, proprietária da empresa de óptica. Produtora de armações de prescrição e de sol desde 1965, a Hedla abandonou no entanto o fabrico em Junho deste ano. “Apesar dos artigos de qualidade que produzimos em Portugal, o abandono do fabrico revela-se uma tendência dominante em todos os sectores de mercado”, acrescentou a responsável. Maria Adelaide Mesquita acompanhou sempre “a evolução tecnológica. Procurámos estar a par da moda internacional no que diz respeito ao ‘design’ dos óculos. Contudo, torna-se muito difícil competir com os preços baixos de alguns mercados estrangeiros”.


Actualmente, a única fabricante de produtos de óptica em Portugal localiza-se em Gondomar. A Sociel preocupa-se em colocar no mercado um produto fiável e com assistência garantida. “Produzimos óculos há cerca de 43 anos. Estamos neste mercado por paixão e porque acreditamos na qualidade que possuímos”, salientou José Maria Rodrigues, sócio gerente da empresa gondomarense. Porém, “não conseguimos competir com os produtos asiáticos em termos de preços e, por isso, a produção em Portugal está a diminuir”, acrescentou José Maria Rodrigues.


Consciente disso mesmo, a Proóptica aposta num modelo de negócio que defende o ‘made in’ Portugal através da marca adoptada, já que o esqueleto das armações confecciona-se no exterior. “Cada vez há menos produtos fabricados no nosso país, devido aos preços atractivos que se encontram além fronteiras”, referiu Luís Justino, proprietário da empresa ‘eyewear’. “Com o intuito de fomentar o consumo da moda nacional, a Proóptica apoia e aposta fortemente em marcas portuguesas de renome internacional, entre elas Quebramar, Lanidor, João Rôlo e Ana Salazar”, destacou Luís Justino.

 

Pensar em português

A campanha da AEP instiga as empresas, os trabalhadores e os consumidores a “pensar em português”, já que Portugal dá garantias de produzir com qualidade e merece, por isso, ser uma primeira escolha. Aliás, através do inquérito que realizámos no nosso site, www.opticapro.pt, apurámos que 80 por cento dos internautas considera que os produtos fabricados em Portugal têm qualidade e de prestígio, enquanto 20 por cento revela o contrário.  

 


Apostar no ‘design’


A completar 15 anos, os sapatos ‘made in’ Portugal Fly London conquistam muitos pés pelo mundo fora. A marca portuguesa cresceu primeiro no estrangeiro e conseguiu avassalar o seu espaço em Portugal há cerca de dois anos. Actualmente, a distintiva está presente em 35 países com 1500 pontos de venda. Esta insígnia aposta verdadeiramente no ‘design’, nos detalhes e no conforto das peças. “Temos colecções jovens, divertidas e desportivas, plenas de cor e originalidade”, disse Amílcar Monteiro, um dos sócios da empresa Kyaia, que detém a marca Fly London.

Também os profissionais do ramo da óptica acreditam que o sucesso do produto português deve basear-se no ‘design’. “Apesar dos óculos de qualidade que se fabricam em Portugal, falta-nos apostar nas formas. Temos profissionais competentes e materiais adequados para inovar e surpreender”, declarou Paula Sá Miranda, da Óptica da Villa, sedeada em Cascais. Manuel Pombinho, da Master Ópticas de Sines, partilha a mesma opinião, referindo que “os óculos fabricados em território português deveriam possuir um desenho mais actual e vanguardista. O estrangeiro ganha-nos neste ponto, graças aos modelos diversificados e distintos que apresenta”.

Desta forma, torna-se urgente implementar iniciativas e estratégias de eficiência colectiva que visem a internacionalização, a inovação, a qualificação e a modernização da moda portuguesa. “Portugal tem capacidade para criar óculos tão bons como os que se fazem em Itália ou França. Incrementar o fabrico português é extremamente importante, já que temos competências para desenvolver produtos esteticamente interessantes e de qualidade incomparável”, explicou António Andrade, da Prismóptica, localizada em Espinho. “No entanto, devemos apostar na segunda venda. Digo isto, porque quando o primeiro negócio é excelente, o português tem tendência a desleixar-se na continuação de um bom trabalho”, acrescentou António Andrade.

Com o objectivo de promover a imagem e a valorização dos produtos nacionais, a Associação Pólo de Competitividade da Moda (APCM) criou o Instituto da Moda, no Porto. Para além de dinamizar todos os quadrantes da moda ‘made in’ Portugal, a ideia consiste em sublinhar a produção que por cá se faz. “Estamos conscientes da necessidade de criar uma cultura de afirmação e de elevação dos artigos portugueses”, proferiu João Costa, presidente da Associação Têxtil e Vestuário de Portugal e dirigente do conselho de administração da APCM.

24 Dezembro 2009
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